“Aproveitamento de Resíduos de Salinas impulsiona produção de Hidrogênio e Água Sanitária”

Um grupo de cinco inventores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) desenvolveu um caminho adicional para a produção de hidrogênio, um combustível limpo, e para a fabricação do hipoclorito de sódio, a popular água sanitária. A geração dos produtos ocorre a partir de uma solução concentrada de cloreto de sódio, presente no efluente salino, por meio de um processo eletroquímico.

O sistema proposto inclui etapas de pré-tratamento da água, nas quais um fluxo de água do mar é processado para gerar um fluxo de alimentação pré-tratado, baseado em água salobra. Portanto, a proposta evita o uso de água potável para a produção de hipoclorito.

“O nosso grupo de pesquisa foca no tratamento de efluentes industriais ricos em cloreto. Inicialmente, tratamos água produzida da indústria do petróleo para gerar hidrogênio. Essa experiência nos levou a trabalhar com o rejeito da indústria salineira, uma água de composição menos complexa, mas com alta concentração de sais, utilizando reatores híbridos. Desse rejeito, produzem-se simultaneamente hidrogênio e hipoclorito, commodities com diversas aplicações, como desinfetantes, tratamento de água e branqueamento de tecidos”, explica Elisama Vieira dos Santos.

Orientadora da pesquisa que resultou na tecnologia, Elisama frisa que o eixo central da invenção é a concepção de um sistema híbrido para a produção de hipoclorito de sódio e hidrogênio, a partir de águas salinas oriundas de rios, lagos, poços, água do mar, resíduos de salmoura provenientes da indústria salineira ou de processos de osmose reversa. Ela destaca que o produto (eletrolisador híbrido) pode ser aplicado em setores como o energético, tecnologias offshore de geração de energia, combustíveis, petroquímica, dentre outras subáreas, como têxtil, desinfecção de águas, como em estações de tratamento de esgoto, e superfícies.

A invenção teve seu pedido de proteção industrial depositado no mês de junho pela UFRN junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e recebeu o nome de “Sistema para a geração de hipoclorito de sódio por meio de fluxo de reciclagem de água salina combinado com a produção de hidrogênio”.

Além de Elisama, são autores do estudo Karen Giovanna Duarte Magalhães, Luis Felipe Silva de Miranda, Jussara Câmara Cardozo e Carlos A. Martínez-Huitle. A pesquisa é desenvolvida no Laboratório de Eletroquímica Ambiental e Aplicada, fazendo parte de uma dissertação de mestrado em Engenharia Química, vinculada também ao programa de pós-graduação em Química.

 

Novas soluções na área de produção de energia e água

O grupo de cientistas pontua que a tecnologia está inserida em um contexto no qual diversas iniciativas estão impulsionando a implantação de energias renováveis em grande escala. Dentre elas, as metas de neutralidade de carbono propostas por diferentes países, a crescente participação global em resposta às mudanças climáticas e o desenvolvimento acelerado da economia verde na era pós-Covid.

“Pensamos que, intrínseco ao estudo, estão os temas sustentabilidade e meio ambiente, crise hídrica e economia circular”, salienta Karen Magalhães, aluna da pós-graduação e orientanda de Elisama Vieira.

Ela identifica que, ao utilizar como matéria-prima um rejeito industrial, como o efluente salino, transformando-o em um produto útil, os pesquisadores buscam novas soluções na área de produção de energia e água, com o hidrogênio como vetor associado.

Karen defende que o invento tem caráter inovador por conectar dois segmentos industriais: um, com a produção de espécies oxidantes, tal como o hipoclorito de sódio, uma possibilidade de tratamento de efluentes que apresentem alta salinidade; o segundo, com o hidrogênio, que é um combustível limpo.

 

Produção permite a transição energética sustentável

Outro aspecto é que a produção de hidrogênio por eletrólise da água, utilizando energia renovável, permite a geração de hidrogênio com emissões reduzidas de CO?, contribuindo para a transição energética sustentável. Além disso, considerando a crescente escassez de água doce no planeta, o uso de águas salinas e residuárias tem se mostrado uma alternativa promissora para a produção de hidrogênio verde, impulsionando o avanço da indústria.

Com relação ao hipoclorito, amplamente conhecido como água sanitária e cuja fórmula química é NaClO, é bastante utilizado na indústria devido às suas propriedades oxidantes, desinfetantes e branqueadoras. As aplicações vão desde a desinfecção de hospitais, laboratórios, indústrias alimentícias e piscinas, além de ser utilizado na produção de papel e celulose e no branqueamento de tecidos na indústria têxtil. Suas múltiplas aplicações destacam sua importância como um componente versátil e essencial em diversos setores industriais.

Carlos Martínez-Huitle fala também que, além disso, essa patente representa um avanço para as tecnologias de produção offshore, ampliando as possibilidades de exploração sustentável dos recursos hídricos disponíveis. Nesse sentido, a inovação da presente invenção consiste em um processo que utiliza um dosador atuando como corrente de reciclo de efluentes salinos para favorecer a produção de hipoclorito de sódio e a simultânea produção de hidrogênio. “Nosso grupo possui quinze anos de expertise em processos eletroquímicos e no design e construção de reatores, com uma destacada capacidade de desenvolver e produzir eletrolisadores internamente, de peças ou equipamentos completos, situação que contrasta com a dependência brasileira de tecnologia importada para a produção de hidrogênio verde”, destaca Martínez-Huitle.

Mexicano radicado no Brasil há quase duas décadas, ele descreve que o sistema compreende um reator eletroquímico de dois compartimentos separados; dois eletrodos, que se conectam com uma fonte de energia elétrica; uma entrada e uma saída de efluente; uma saída de gás; e demais peças vedadas. “São quatro etapas interligadas, que foram ajustadas para potencializarmos a relação entre a produção do hipoclorito de sódio para cada litro de solução salina utilizada”, enfatiza Martínez-Huitle.

 

 

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